O Bobo da Corte e o Rei.

Já fiz tantos reis rirem, meu soberano, que constatei o incontestável:

Enquanto vos são súditos, deslumbrante lhes é a coroa, imponente o cetro, exuberante o trono!
Estais rei! Regozijai-vos! É vero, meu rei!
Sois o tudo: o sol que doura e esquenta, o mar que refresca, a terra que prospera...
Ainda que vos dispais, ou como mais comumente ocorrerá,vos dispam das indumentárias, ou dos jóias de vossos tesouros, ainda que estejais totalmente nu, não perdereis a majestade, que recebestes. Ainda que débil, meu rei, beijar-vos-ão as mãos. Diante de vós, genuflexos, dar-vos-ão a alma, Alguns, até o corpo vos irão ofertar...
Tereis insistentes, comoventes e convincentes juras de fidelíssimo amor...
Empolgai-vos com as reverências, extasiai-vos com as tenras carnes, tereis até as inconcebíveis...
Desfrutai das vossas insígnias reais, dos vossos domínios, de vossa fidalga imagem. Mas não negligenciai, não ireis querer sentir o amargor da derrota.
Empunhai a vossa espada! É tudo tão frágil, meu rei! Colocai o vosso elmo e, com a mão oposta à da espada, empunhai a égide e vos mantenhais atento... É tudo tão efêmero, meu rei! Tão breve...
Se deposto – jazeis, outro sol assumirá! Simples assim... 

Então, sentireis o amargor dos abandonos...

Jamais, meu rei, apegai-vos aos cerimoniais inebriante das reverências, à oratória empolgante das juras, da eloquência com que revestem as loas a vós, nem aos calientes encantos da carne. Atentai apenas para o vosso reino e missão, meu empolgado e empolgante rei, que mesmo neste mundo, têm muito de sagrado! 
Não vos esqueçais: toda autoridade emana do Altíssimo! 
Meu rei, de tudo tereis, enquanto sois rei. E credes, tão e tão somente, enquanto sois rei!